quinta-feira, 24 de abril de 2025

Rindo da Honra – Crônica de um país que se perdeu

 

Por Jânsen Leiros Jr. 

“De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver crescer a injustiça...” — Rui Barbosa
… e de tanto ver o Brasil ser roubado, começamos a achar graça... da própria desgraça.

Na semana passada, a Polícia Federal deflagrou uma operação que descobriu uma das maiores fraudes da história recente do Brasil: 6,5 bilhões de reais desviados em benefícios previdenciários do INSS. Isso mesmo. Seis bilhões e meio. Não é erro de digitação.

Segundo o que foi apurado, servidores públicos e intermediários fraudavam aposentadorias, pensões, auxílios-doença e tudo mais que estivesse ao alcance do braço comprido da corrupção. Usavam documentos falsos, laudos forjados, pessoas mortas, CPFs inexistentes, e até processos judiciais plantados. Um esquema sofisticado, em que o crime se profissionalizou com a mesma eficiência com que o cidadão de bem é humilhado nas filas da Previdência.

Imagine agora o aposentado real, que trabalhou quarenta anos, contribuiu direitinho, e espera três, quatro, cinco meses — ou mais — para ter um benefício de R$ 1.300 liberado. Enquanto isso, fraudadores sacam pensões milionárias com certidões frias e contas quentes. Ninguém sabe quantos beneficiários fantasmas existiram. Mas os bilhões são reais. Muito reais.

Diante disso, o mínimo que podemos sentir é indignação. Mas já estamos tão anestesiados que o máximo que fazemos… é rir. Rir de nervoso, rir de desespero. Rir da honra. Porque neste país, a honestidade virou piada — e a corrupção, rotina.


Há quem se ofenda quando digo que o Brasil é um país de bandidos. Mas, ora, ofendem-se por quê? Porque é mentira… ou porque é verdade demais?

A verdade é que o apetite dos bandidos por dinheiro público neste país tem crescido de forma exponencial — e eles não estão nem disfarçando mais. É quase um esporte nacional.

Vamos lembrar de onde viemos. O primeiro presidente da República a sofrer impeachment caiu por um escândalo envolvendo… uma Fiat Elba. Um carro popular. Um presente indevido. Valor estimado, à época, na casa dos 10 mil dólares. Uma ninharia, perto do que viria depois.

Logo em seguida, o escândalo dos "anões do orçamento". Fraudes em emendas parlamentares, usando laranjas, ONGs fantasmas e dinheiro escorrendo pelo ralo da corrupção. Prejuízo estimado: 100 milhões de dólares. Um salto olímpico no roubo institucionalizado.

Avançando no tempo, tivemos mensalão, petrolão, rachadinhas, pastores com barras de ouro, malas de dinheiro, cuecas abarrotadas, offshores em paraísos fiscais… e agora, a cereja do bolo: fraudes nas contas de aposentados e pensionistas do INSS, com rombo de 6,5 bilhões de reais! Uma aberração contra os que mais precisam, os que menos têm.

A pergunta que ecoa: onde isso vai parar? Ou, talvez, mais importante: quando isso começou a parecer normal?

Como bem disse Rui Barbosa, “de tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.” E é esse riso trágico que ouvimos hoje nos corredores da República.

Porque aqui, quanto maior a fraude, maior o prestígio. Quanto mais você rouba, mais você é respeitado — pelo menos entre seus pares. Porque, para o povo, o que sobra é o corte no remédio, a fila na previdência, a escola sem merenda e o transporte com catraca quebrada.

O Brasil virou um bufê aberto de recursos públicos, onde quem tem fome de desonestidade nunca sai de mãos vazias. E quem ousa denunciar é chamado de radical, de moralista, de ultrapassado.

Mas será mesmo ultrapassado querer um país decente? Será piegas pedir ética e justiça?

O que temos visto não é apenas corrupção. É uma falência moral, institucional e social. E isso não se resolve apenas com novas leis. Resolve-se com vergonha na cara. Com exemplo de cima para baixo. E com uma sociedade que se recuse a rir da própria desgraça, que decida, enfim, se levantar da cadeira da passividade.

O Brasil já teve orgulho. Já teve honra. Já teve heróis — ainda que anônimos. E ainda os tem, espalhados pelo país, sustentando esse chão com trabalho honesto e dignidade silenciosa.

É hora de trazer esses heróis à luz. De recusar o riso fácil diante da imoralidade. De olhar no espelho e recuperar o gosto por ser brasileiro — não pelo futebol, não pelo carnaval, mas pela possibilidade de sermos, de novo, uma nação séria.

É hora de romper o ciclo. De dar nome aos corruptos, de exigir justiça, de erguer a cabeça e não aceitar mais o título de país dos espertos, dos bandidos, dos impunes.

Enquanto isso, seguimos aqui — no rádio, na escrita, na resistência.
Não apenas tentando salvar alguma lucidez, mas plantando esperança lúcida, crítica e firme. Porque rir da honra pode até virar hábito. Mas lutar por ela ainda é o maior ato de amor que se pode oferecer a um país.

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